24

Sesión paralela

Sesión híbrida: No

Terras e Águas em Disputa: Conflitos, Bens Comuns e Pertencimento em Territórios Rurais e Periurbanos Ibéricos, Atlânticos e Pós-coloniais

Leonardo Soares dos Santos
Universidade Federal Fluminense
Sarita Mota
(CIES-Iscte (Portugal)
Vitória Schettini
PPGH/UNIVERSO/Brasil

Por determinar

Por determinar

POR DETERMINAR

Esta sesión reúne investigaciones históricas e interdisciplinares que examinan las disputas en torno a la tierra y al agua como recursos estratégicos y formas de bienes comunes en contextos rurales y periurbanos ibéricos, atlánticos y poscoloniales. Con una perspectiva comparativa y crítica, se busca comprender cómo los procesos de apropiación, uso y resistencia moldearon conflictos, identidades y regímenes de gobernanza desde el siglo XIX hasta la actualidad.
Las ponencias conectan experiencias situadas en Brasil, Portugal y Estados Unidos, marcadas por desigualdades en el acceso a la tierra, transformaciones ambientales y regímenes normativos en disputa. En Portugal, se analizan los impactos de la sequía en el Algarve, desde el período medieval hasta el siglo XX, con el objetivo de contextualizar la actual crisis climática y reflexionar sobre estrategias de adaptación a largo plazo, así como las movilizaciones campesinas por la reforma agraria y las luchas ecológicas entre 1970 y 1989. La gestión de las aguas transfronterizas en la Península Ibérica es examinada a partir de la Convención de Albufeira (1998), destacándose desafíos persistentes como los conflictos por trasvases, impactos ecológicos y usos industriales de los ríos Tajo, Duero y Guadiana. En el Brasil imperial, el uso de la georreferenciación permite investigar el papel de los ríos en las conexiones entre los sertões fluminenses y los centros urbanos, así como la influencia de las lluvias y del relieve en la ocupación del suelo y en las prácticas agrícolas del siglo XIX. Se propone también un enfoque comparativo entre California (Estados Unidos) y el Valle de São Francisco (Brasil) entre las décadas de 1960 y 1980, explorando los efectos de la escasez hídrica y de las políticas de irrigación. En el Brasil contemporáneo, se analizan los impactos de la especulación de tierras (grilagem) y de la represión durante la dictadura civil-militar (1964–1985), así como las formas de resistencia y territorialidad del campesinado negro y quilombola, respectivamente en la localidad de Gardênia Azul y en el territorio de Camorim, ambos en la zona rural de la ciudad de Río de Janeiro. Finalmente, se reflexiona sobre los efectos de la desposesión ecológica y de la gobernanza armada sobre los bienes comunes, especialmente en contextos de excepción legal e informalidad normativa, con foco en antiguas áreas de preservación rural y ambiental.
La sesión pretende avanzar hacia preguntas que profundicen nuestra comprensión de las relaciones entre el desarrollo económico y las formas de movilización, organización, gestión y gobernanza de los territorios. Procesos que han atraído a historiografías densas se han vuelto más complejos, a medida que nuevas cuestiones y enfoques permiten identificar redes de sociabilidad y nociones de derechos en el mundo rural, desafiando y renovando la historiografía tradicional.
Nuestro panel acoge este desafío y propone reflexionar sobre cuestiones como: ¿cuáles fueron los impactos de la “gran transformación” en la vida cotidiana, en las redes de sociabilidad, en las múltiples desigualdades y en las formas de organización, adaptación y lucha? ¿Qué acciones colectivas —visibles o soterradas— surgieron en estos contextos en Brasil, Portugal y Estados Unidos? Acogemos investigaciones en distintas escalas geográficas, especialmente aquellas que reconozcan conexiones transnacionales o dialoguen con debates internacionales recientes.

Papers

Disputas de água e terra no semiárido dos Estados Unidos e do Brasi: contradicções das políticas públicas de reforma agrária
Clifford Andrew Welch
Universidade Federal de São Paulo
A predominância do agronegócio e o regime corporativo de alimentos no século XXI, são, em grande parte, produtos de políticas públicas implementadas no período pós-Segunda Guerra Mundial. Entre essas políticas, a mais irónica de todas foi a reforma agrária. Caso após caso, os programas de reforma agrária foram apresentados ao público como planos para o justo assentamento de camponeses pobres nas terras que trabalhavam, quando, na realidade, acabaram por espolia-los em favor de fazendeiros protegidos pelo Estado. Muitos desses pequenos agricultores foram deixados com poucas alternativas além de trabalhar como diaristas, volantes ou em outras formas precárias de trabalho. Outros, tornados redundantes pelo uso de químicos e máquinas, precisavam deslocar-se em busca de sustento. Em zonas áridas e semiáridas, projetos de gestão de água para irrigação provocaram transtornos semelhantes.Nesta comunicação, vamos compartilhar resultados de pesquisa sobre casos especificos no Brasil e nos Estados Unidos da América – dois dos maiores países produtores e exportadores de alimentos no mundo, modelos globais para o agribusiness. No período pós-guerra, o Vale Central do estado da Califórnia foi palco da construção de 20 barragens, inclusive usinas hidrelétricas, e mais de mil quilometros de canais para a transposição de agua. No Brasil, nove projetos semelhantes transformaram a região do Vale do Rio São Francisco, provocando grandes impactos na vida de cinco estados.Embora a narrativa predominante seja a de progresso, modernização e abundância, persistem até hoje narrativas de resistência e gritos de alarme sobre as consequências negativas dessas transformações para a saúde do planeta. Neste trabalho, vamos destacar as resistências do movimento National Land for People (NLP – Terra Nacional para o Povo) no Vale Central e, no Brasil, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), para mostrar como o discurso da reforma agrária foi utilizado para promover projetos que, na prática, serviram a finalidades contrárias, gerando impactos problemáticos.
Campesinato Negro e a formacao da Comunidade Quilombola Cafunda Astrogilda
Júlio de Souza Dória
Nottingham University Samworth Academy
O objetivo desta apresentação está relacionada à discussão da expansão conceitual do termo camponês como categoria de análise empregada nos estudos sobre comunidades negras e mestiças brasileiras, no pós-abolição. O presente trabalho se baseia no estudo de caso da Comunidade Quilombola Cafundá Astrogilda, localizada na zona oeste da cidade do Rio de Janeiro, Brasil. E nesse sentido, a pesquisa está delimitada cronologicamente as 3 décadas subsequentes ao fim da escravidão no Brasil. A nossa análise tem como ponto de partida o conceito de campesinato negro, adotado por pesquisadorxs brasileirxs. Entendemos que a incorporação ressignificada deste termo tem ampliado a discussão sobre o significado/sentido do termo camponês-campesinato para além da tipificação tradicional europeia. A adoção do termo campesinato negro tem se mostrado promissora na explicação e entendimento dos aspectos sociais relativos as comunidades negras e mestiças rurais brasileiras. Nesse sentido, entendemos que a revisão do conceito de camponês voltado para análise sócio-histórica do pós-abolição no Brasil está dentro de uma pesquisa acadêmica decolonial, em que as formas de saber se ressignificam e adaptam ao novo contexto espacial e cultural. Sobretudo, por direcionarmos uma pertinente crítica sobre a sistemática desracialização da aplicação deste conceito. Para além dos rigorosos critérios científicos utilizados na categorização conceitual dos processos históricos, tentamos propor uma expansão da análise conceitual do termo camponês a partir de um contexto diferente do europeu, marcado sobretudo pela escravidão. Considerando a condição sócio-econômica de alforriados e libertos, principalmente concernente ao acesso e usos da terra, torna-se fundamental a ressignificação deste conceito para melhor explicar a realidade rural brasileira. Todavia, não propomos aqui que esta expansão conceitual seja aplicada a outros contextos sócio-históricos nem tampouco o europeu, onde tal conceito se originou. Acreditamos que eventuais futuras revisões conceituais, se necessárias, devem ater-se aos seus específicos contextos. Entretanto, entendemos que esta terminologia expande e adapta tal conceitualização de forma adequada e pertinente a uma das principais facetas históricas da ruralidade brasileira.
Luta por terra na zona rural carioca no contexto de uma Ditadura Militar: o caso de Gardênia Azul (1964-1984)
Leonardo Soares dos Santos
Universidade Federal Fluminense
A situação da agricultura no antigo Sertão Carioca (zona rural da cidade do Rio de Janeiro) era muito difícil nos primeiros anos da década de 60. Os loteamentos não davam mostra de recuo. Pelo contrário. Eles se alastravam por diversos pontos da Baixada de Jacarepaguá, área periférica da cidade. O investimento em loteamentos urbanos se mostrava lucrativo para alguns agentes do mercado imobiliário. Tudo se complicaria com a eleição de Carlos Lacerda (um dos líderes da direitista UDN) em 1960 como primeiro governador eleito do recém-criado estado da Guanabara. Durante a sua administração o udenista tomaria várias medidas para restringir ao máximo a zona rural carioca, inclusive em termos geográficos. No novo zoneamento urbano da cidade, a Zona Rural passou a ser vista como uma área de expansão de atividades urbanas e industriais. A agricultura passava a ser um vestígio do passado. Um pouco antes do Golpe Militar de 1964, o Governo Carlos Lacerda já faria os seus estragos. Mas a história não havia acabado aqui. E a vitória do capital imobiliário não era algo líquido e certo como poderia parecer. Havia muita incerteza no horizonte. Mesmo que não parecesse, havia uma história em aberto. Muita resistência ainda era tecida por parte de moradores dessas regiões que seriam reconfiguradas num contexto de crescimento desordenado e desigual, tão típico da geografia social das periferias da cidade carioca. O foco aqui é o processo de ocupação do território hoje conhecido como Gardênia Azul por parte de grupos populares que buscaram (re)construir suas vidas na medida em que lutavam por terra para moradia a partir dos anos 1960, atravessando um duro e desafiador contexto marcado pelo regime militar, o que tornava toda forma de resistência e luta, ainda mais sendo popular, algo perigoso. E mesmo assim, eles insistiram e persistiram. Por essa razão, com base em material jornalístico da época, processos judiciais, relatórios da polícia (inclusive política, como o DOPS), depoimentos de antigos moradores, analiso os principais momentos do embates entre moradores e pretensos proprietários da região, a interlocução realizada junto a agentes públicos e estatais, as formas de organização e mobilização, as estratégias de luta, e as tensões e conflitos que foram sendo desencadeados no transcorrer das lutas do “movimento” daqueles moradores. É a história que pretendo analisar.
Desposesión, Milicias y Bienes Comunes: Territorios de Espera en la Zona Oeste de Río de Janeiro
Sarita Mota
CIES-Iscte – Instituto Universitário de Lisboa
En tiempos de crisis habitacional, ambiental y democrática, esta comunicación analiza los procesos de desposesión territorial en zonas rurales-urbanas de la Zona Oeste de Río de Janeiro, con énfasis en las antiguas freguesías de Guaratiba y Campo Grande, desde la década de 1970. A partir de un trabajo de campo que incluye entrevistas con residentes y líderes comunitarios, análisis de documentos administrativos y cartografía crítica, el estudio examina cómo las políticas de regularización de tierras, los proyectos de urbanización y los discursos institucionales sobre desarrollo reconfiguran los modos de uso, ocupación y permanencia en estos territorios. El análisis muestra que la expansión de loteamientos, las restricciones al uso agrícola y la titulación precaria generan inseguridad de la tenencia, fragmentación social y promesas no cumplidas de inclusión territorial. En estas zonas, a menudo denominadas “territorios de espera”, los moradores enfrentan una convivencia marcada por la tensión entre la formalidad estatal y formas paralelas de ordenamiento. Las milicias emergen como actores centrales, convirtiendo la tierra en “puerta de entrada” para el control territorial, imponiendo normas propias y mercantilizando bienes colectivos como el agua, la electricidad, el transporte o el ocio. La Zona Oeste expresa una realidad de múltiples normatividades, donde el derecho estatal, las prácticas comunitarias y el dominio armado disputan legitimidad. La destrucción de ecosistemas como los manglares de Guaratiba –verdaderos bienes comunes naturales– revela los efectos de la desposesión ecológica inducida por la financiarización y la especulación inmobiliaria. Frente a este escenario, se propone repensar los criterios que legitiman el acceso a la tierra, valorizando prácticas cotidianas de uso, cuidado y permanencia como base de ciudadanía territorial. Más allá de una visión centrada en la propiedad formal, se plantea que los bienes comunes urbanos y rurales deben entenderse como construcciones sociales basadas en la gestión colectiva, la responsabilidad compartida y la defensa de la dignidad territorial frente a la exclusión, la violencia y la ausencia del Estado.
Por entre rios, chuvas, relevos e produções: Nossa Senhora das Neves do sertão do rio Macaé, 1854-1857
Vitória Schettini
PPGH/Universo
Otros autores: Rafael Laguardia PPGH/Universo rafaellaguardia1@gmail.com
É correto afirmar que as chuvas, os rios e o relevo foram (e são) determinantes para as culturas agrícolas no Brasil e no mundo, sendo fundamentais para a escolha, o desenvolvimento e a sustentação da produção. Usar esse entendimento para discutir sociedades pretéritas pode permitir uma série de deduções a partir do diálogo interdisciplinar entre a História e a Geografia. Porém, não é uma abordagem muito nova no meio acadêmico, pois vem desde as primeiras gerações da Escola dos Annales, e que foi solidificada por Fernand Braudel. Este diálogo possibilita uma maior dinamização dos acontecimentos que são vistos não como algo estático, mas como um processo contínuo que desenvolve e modifica ao longo do tempo. Assim, os elementos que compõem o quadro geográfico de uma região, como as mudanças climáticas, os rios, a ocorrência de chuvas e o relevo, por exemplo, podem influenciar em todas as estruturas sociais e econômicas da população historicamente construídas. Nossa Senhora das Neves do sertão do rio Macaé, freguesia no qual os holofotes estarão voltados, caracterizava por um quadro de ocupação distinto em relação ao tamanho das propriedades, do relevo e da localização dos rios, o que irá influenciar diretamente no tipo de produção agrícola e no quadro populacional, podendo variar entre moradores mais antigos, na sua maioria composto por portugueses, e habitantes mais recentes, com forte presença suíça. Desde modo, esta comunicação tem o objetivo de analisar as influências dos aspectos físicos e geográficos, principalmente dos rios, do nível pluviométrico, do relevo, no uso e ocupação do solo na freguesia eleita, durante o período compreendido entre 1854 e 1857. Metodologicamente, será usada uma abordagem interdisciplinar baseada no Sistema de Informações Geográficas, a fim de cruzar informações geográficas com documentos históricos, principalmente, os Registros Paroquiais de Terra, que serão cruzados com o Almanak Laemmert e os registros paroquiais.
Convenção de Albufeira: Cooperação e Conflito nas Bacias Hidrográficas Luso-Espanholas
Leonardo Aboim Pires
ISEG Research in Economics and Management
El proceso revolucionario que tuvo lugar en Portugal (1974-1976) forjó las condiciones para el surgimiento de un significativo número de movimientos sociales y asociativos en el seno del campesinado, aunque ya en la fase final del régimen autoritario se percibían algunas pruebas de descontento y protesta. El más relevante de estos fue la reforma agraria en la región sur (1975-1977), donde la movilización popular condujo a la ocupación de tierras y la exigencia del fin del sistema latifundista. En otras zonas del país, como el norte, donde predomina un sistema de agricultura familiar, surgieron otras formas de lucha dirigidas a poner fin a diversas obligaciones impuestas a los agricultores. El acceso a los recursos naturales, a la tierra y la devolución de la propiedad comunal, como los baldios, fueron cuestiones que formaron parte de la dinámica revolucionaria y fueron ampliamente debatidas por la opinión pública y las estructuras políticas. Tras la revolución y el inicio del proceso de consolidación democrática, las luchas campesinas no cesaron, ya que buscaban preservar las conquistas revolucionarias, en particular frente a la contrarreforma agraria iniciada en 1977, así como adaptarse a los ajustes socioeconómicos necesarios para la adhesión de Portugal a la CEE en 1986. Esta situación se manifestó en 1989, cuando la revisión constitucional llevada a cabo entonces, en un ambiente de descarga ideológica, suprimió la referencia a la reforma agraria. Paralelamente, el movimiento ecologista cobró fuerza en el país, y las luchas rurales comenzaron también a centrarse en cuestiones relacionadas con la polución, la extracción de recursos y el tratamiento de residuos. Un ejemplo de este fenómeno es la creación del Movimiento Ecológico Portugués en 1974 y, más tarde, la fundación del Partido Ecologista 'Os Verdes', en 1987. En este contexto, la presente comunicación traza la evolución histórica de las luchas y los movimientos sociales surgidos en Portugal entre la dictadura, la revolución y el proceso de democratización en los que estaban presentes las disputas por los recursos naturales y la construcción de bienes comunales, con el objetivo de comprender su alcance territorial, su inserción política, así como los métodos de acción y las formas de movilización empleadas.
Convenção de Albufeira: Cooperação e Conflito nas Bacias Hidrográficas Luso-Espanholas
Marcella Melo Conceição
Instituto de Ciências Sociais – Universidade de Lisboa
A água, recurso essencial à vida, tornou-se foco de disputas e acordos de cooperação estratégicos em um mundo marcado pela escassez hídrica potencializado pela crise climática. Traz-se neste trabalho, uma análise da gestão das águas transfronteiriças compartilhada entre Portugal e Espanha, abordando a evolução histórica da cooperação e os conflitos emergentes no âmbito da Convenção de Albufeira (1998). A análise parte da descrição das assimetrias territoriais na disponibilidade hídrica da Península Ibérica e do histórico de acordos bilaterais, que culminaram na assinatura da Convenção visando a gestão sustentável das bacias. Contudo, desafios persistem: práticas de transvases para fins agrícolas e energéticos, descargas intermitentes que comprometem os ecossistemas ribeirinhos, disputas pelo uso das águas do Rio Tejo, Douro e Guadiana, e tensões provocadas por atividades industriais como a manutenção da central nuclear de Almaraz. A pesquisa evidencia que, apesar dos avanços institucionais, a gestão e governança das águas transfronteiriças ainda enfrenta limites técnicos e políticos, particularmente na distribuição dos caudais ecológicos e no equilíbrio entre demandas agrícolas, urbanas e ambientais, além das questões de disponibilidade do recurso nos dois países. Em períodos de seca severa, como aconteceu em 2022 na Península Ibérica, as tensões para o uso da água se acentuaram, provocando protestos e renegociações, o que trouxe a necessidade de reavaliação de critérios do acordo. Neste contexto, discute-se a necessidade de revisão periódica da Convenção de Albufeira, a incorporação de critérios de adaptação climática, o fortalecimento da participação pública e a transparência na gestão como caminhos para consolidar o direito humano à água e promover uma governança hídrica mais justa e resiliente no contexto ibérico.
A Seca no Algarve: Perspectivas Históricas sobre Impactos Climáticos
Andreia Fidalgo
Universidade do Algarve
O Algarve, apesar da sua influência atlântica, apresenta uma forte afinidade com o clima mediterrânico, caracterizado por uma variabilidade interanual significativa da precipitação. A escassez e irregularidade das chuvas são fenómenos recorrentes, verificando-se ciclos de seca que alternam com anos de maior pluviosidade, frequentemente marcados por episódios de chuvas torrenciais e cheias. Estas oscilações, muitas vezes organizadas em sequências plurianuais de anos secos ou húmidos, tendem a acentuar ainda mais a gravidade dos seus impactos no território e nas comunidades locais. Nas últimas décadas, a região tem enfrentado um período de seca prolongada sem precedentes na memória recente, agravando severamente a crise hídrica e colocando sob pressão múltiplos sectores económicos e sociais. Este contexto levanta uma questão fundamental: estará o Algarve a viver uma situação verdadeiramente inédita, ou poderá a História revelar episódios análogos, em que as oscilações climáticas perturbaram as populações e as suas actividades económicas? Este paper propõe-se investigar a forma como as comunidades algarvias do passado experienciaram e responderam a fenómenos climáticos extremos, com especial enfoque nas estratégias de resiliência e recuperação. A análise assenta em fontes documentais que abrangem desde o período medieval até ao século XX, permitindo identificar relatos de secas, eventos meteorológicos extremos e as respostas sociais e económicas que deles decorreram. Para os períodos anteriores à existência de registos sistemáticos de precipitação, recorre-se a uma análise qualitativa que procura evidenciar a intensidade e a duração dos episódios climáticos, bem como as suas repercussões socioeconómicas, sobretudo em sociedades fortemente dependentes da agricultura de sequeiro. Adicionalmente, estabelece-se uma comparação entre as estratégias de gestão da água e os mecanismos de adaptação implementados ali e noutras regiões mediterrânicas, de forma a compreender a diversidade e eficácia das respostas desenvolvidas em contextos climáticos semelhantes. Os resultados visam oferecer uma contextualização histórica dos desafios actuais, enquadrando-os em ciclos seculares de tensão e recuperação ambiental, e, desse modo, contribuir para uma reflexão mais aprofundada sobre as possibilidades de adaptação a longo prazo face às alterações climáticas contemporâneas.
A fabricação da desigualdade: exclusão fundiária e de direitos na “longa duração” da história da ocupação territorial brasileira
Mônica Ribeiro de Oliveira
Professora Titular do Departamento de História da Universidade Federal de Juiz de Fora - MG
"Na investigação que está sendo conduzida elegemos o estado de Minas Gerais, na região centro-sul do Brasil, como um laboratório, no qual se percebe a presença de diferentes gerações de populações afrodescendentes, excluídas e marginalizadas atualmente vitimadas por relações exploratórias de trabalho. No atual quadro do espaço rural brasileiro como um todo, persistem relações de trabalho arcaicas e excludentes, legados do escravismo, que podem ser caracterizadas pelo que S. Chalhoub denominou por “precariedade da liberdade” (Chalhoub, 2011). A presença recorrente de situações análogas à escravidão em diferentes regiões do estado de Minas deve, antes de tudo, ser vista como uma consequência, sintoma da ausência do estado, da existência de elites agrárias conservadoras, de acesso à terra, controle da força de trabalho com base em relações de poder e uma história de exclusão e violação dos direitos humanos, mesmo nos momentos em que o país passava por uma série de conquistas para os trabalhadores. Sintoma também do acesso à terra e demais recursos naturais pelos mais pobres pela posse e não pela propriedade formalizada, um acesso precário, um total abandono da população rural por séculos. Minha compreensão é que a história da vulnerabilidade de afrodescendentes egressos da escravidão não terminou e se escancara nos dias de hoje, nos pressionando por outras políticas urgentes, novas práticas e atitudes de reparação. Na vastidão do território de Minas Gerais no século XVIII, a expansão sobre os sertões e a vinculação destas áreas ao projeto colonizador, abria espaços para a constituição de comunidades sem, necessariamente, estarem organizadas por estruturas formais e espaços mais urbanizados: povoados, arraiais, curatos, distritos, ou qualquer outra titulação inferior ao status de vila se reproduziam por todo o território das minas. O espaço rural passa a reunir não só propriedades de diferentes dimensões, mas concomitantemente, se caracteriza pela presença de indivíduos com mínimas possessões territoriais, roças e matos, compondo uma camada “invisível” de gente de cor livre. Indivíduos e famílias originários do cativeiro por meio de diferentes acessos a alforria, que se reproduziram ao longo dos anos, acrescido por diferentes gerações de grupos indígenas que resistiam nas matas e aldeias. Ao longo dos anos, esse grupo se ampliou até que o processo de abolição, nos finais do século XIX, agregasse outros indivíduos, famílias e comunidades de homens e mulheres livres de cor: pretos, pardos e africanos. Pelas décadas subsequentes à abolição, essa população se manteve consolidando aqueles pilares que antes a caracterizavam: por um lado, um instável acesso à terra, por outro, a ocupação de roças e matos nas periferias das grandes e tradicionais propriedades, submetidos às relações de poder e paternalistas de seus antigos senhores, mas sempre associados à agência familiar. Durante o século XX, pessoas e famílias afrodescendentes permaneceram nas áreas rurais, lidando com a negligência do Estado, mesmo diante de alguns progressos que a sociedade brasileira alcançou no campo do trabalho na metade do século, conformando o atual quadro das relações análogas à escravidão."